sexta-feira, 12 de agosto de 2016

Da arte de cuidar dos gatos


Esqueçamos, pois, a caixa de areia e tigelinha com água fresca. Vamos falar agora dos pequenos detalhes que só os donos conhecem. Primeiro de tudo, desapegue-se. Esqueça os seus objetos. A vida agora deve ser pensada para o seu gato. De repente, as coisas todas serão organizadas de modo que ele não as quebre ou danifique. E não há nada de ruim nisso.
Não se importe com o seu sofá ou com ou seu colchão, isso não é mais seu.  Cuidado com os fones de ouvido ou com os fios soltos, gatos, assim como ratos, podem roê-los. Cadarços, roupas, óculos e celulares. Cadarço solto pela casa, esqueça. Roupas, não sei, mas é sempre bom ter cuidado. Óculos e telas de celulares podem ser arranhados com facilidade, muita facilidade (É melhor não ter mais nada).
Sabe a xuxinha de cabelo? Você deve escondê-la. É sempre bom deixar o papel higiênico escondido, gatos gostam disso. Cuide para que os copos não fiquem ao alcance do bichinho, porque, não se sabe como, os gatos sentem prazer em vê-los caindo. Cuidado principalmente com os copos de vidro. Cuidado com as prateleiras. Cuidado com tudo!
Se o dono mora em apartamento, então, a coisa piora. Gatos gostam de janelas. Portanto, se a janela não tem tela de proteção, deve-se mantê-la fechada. É preciso ter cuidado para não deixar a porta aberta. E não posso me esquecer: esconda as suas bijuterias, ah, e o seu fogão também! Brincadeira! Mas é que, o gato daqui quebrou até o fogão! Não se preocupe, com o tempo, essas coisas viram parte da rotina.
         Por último e mais importante, nunca se esqueça do amor. Se não for para amá-lo, é melhor não tê-lo. Cuide, ame, proteja. Gatos, assim como todos os animais, merecem todo nosso respeito e cuidado.

quinta-feira, 11 de agosto de 2016

Arte de amar, Manuel Bandeira


Arte de amar. Manuel Bandeira

Se queres sentir a felicidade de amar, esquece a tua alma.
A alma é que estrega o amor.
Só em Deus ela pode encontrar satisfação.
Não noutra alma.
Só em Deus - ou fora do mundo
As almas são incomunicáveis.
Deixa o teu corpo entender-se com outro corpo.
Porque os corpos se entendem, mas as almas não.

In: Belo belo

terça-feira, 9 de agosto de 2016

Se eu quiser falar com Deus


Se eu quiser falar com Deus 
Tenho que ficar a sós 
Tenho que apagar a luz 
Tenho que calar a voz 
Tenho que encontrar a paz 
Tenho que folgar os nós 
Dos sapatos, da gravata 
Dos desejos, dos receios 
Tenho que esquecer a data 
Tenho que perder a conta 
Tenho que ter mãos vazias 
Ter a alma e o corpo nus 
Se eu quiser falar com Deus 
Tenho que aceitar a dor 
Tenho que comer o pão
Que o diabo amassou 
Tenho que virar um cão 
Tenho que lamber o chão
Dos palácios, dos castelos 
Suntuosos do meu sonho 
Tenho que me ver tristonho 
Tenho que me achar medonho 
E apesar de um mal tamanho 
Alegrar meu coração 
Se eu quiser falar com Deus 
Tenho que me aventurar 
Tenho que subir aos céus 
Sem cordas pra segurar 
Tenho que dizer adeus 
Dar as costas, caminhar 
Decidido, pela estrada 
Que ao findar vai dar em nada 
Nada, nada, nada, nada 
Nada, nada, nada, nada 
Nada, nada, nada, nada 
Do que eu pensava encontrar 

Gilberto Gil, 1980







Não tem nome



Essa coisa que não tem nome. Essa coisa mágica, esse querer bem, essa vontade de estar perto. Bálsamo benigno, signo, guru e porto seguro. Mar e mãe, medo e champagne, visão do espaço sideral. Fumo e yoga, paixão e carnaval.
Luz e nuvem. O envolvimento de um abraço que faz ver estrelas e conhecer um pedaço do paraíso. Olhos brilhando e sorrisos de crianças. Andanças de mãos dadas pelo mundo. Planos e sonhos. Cuidado na doença, beijo na testa. Defender com unhas e dentes. O telefone que toca pra se ter uma conversa rápida. É aquele carinho de quem levanta cedo só para comprar produtos orgânicos para o outro. E aquela moça ou rapaz que compra um remédio na farmácia sem querer nada em troca.
Respeitar as dores, perguntar se chegou bem em casa, e, melhor ainda, acompanhar no caminho. Deixar na porta de casa. É olhar nos olhos e poder chorar sem medo. Entender que o passado existe, mas que quem ama vive só para o presente. Sonhar com paisagens e viver poemas. Caminhar canções e beijar instantes.
É uma essência divina, uma centelha, é a visão do universo. É maior do que tudo, é espiritual, é alma, coração e tudo que há de mais belo no mundo. Talvez macio, talvez solar, talvez parte da lua. É uma praia deserta e uma mata selvagem. Existe para homens, mulheres, crianças e animais.
Talvez, se os olhos forem fechados, há de se sentir alguma coisa. Talvez um sussurro diga o seu nome em algum sonho bonito. É uma mãe, um irmão, um amigo, um namorado e uma esposa. Existe no sorriso dos filhos que eu ainda terei e nos animais que eu já amo. O cuidado, a ternura, a expressão daquilo que há de melhor no ser no ser humano. Coisa universal, coisa que a gente faz pelos outros só pelo prazer de fazer o bem a alguém, coisa que mora nos olhos de quem ama. Coisa que eu nem sei mais explicar, isso que não tem nome. 

Aos que amam




E quem nunca confundiu um campo árido com um rio sereno? Amor é palavra forte e a busca até ele confunde. Amor é construção? E o amor à primeira vista?  Eu não sei de nada, mas alguma coisa a vida me ensinou. Vida, coisa que, aliás, é sinônimo de dualidade. Tudo no universo respira lados opostos. É a lei.
A vida carrega a morte e amor carrega o desamor. E veja só, o desamor ensina sobre o amor. Das coisas que vi, aprendi que a mente engana e que é fácil achar que se pode mergulhar num rio seco. Vejo o ser humano como uma coisa pequenininha tentando alcançar esse sentimento bom. Há tantos labirintos dentro da mente que amar é uma coisa difícil. A arte dos sentimentos, aquilo que se constrói na infância, os apegos, a noções sobre afetos. O que os pais dão, o que se recebe, o que se cria e o que se sente. Inseguranças, traumas, ansiedades, solidões. O que somos nós. Falo aqui do amor entre duas pessoas. A carga semântica dessa palavra não cabe num texto.
Nascemos sem escolha e aqui estamos. Uns nascem sem saber amar, sem sentir empatia, sem sentir. Outros amam além da conta e outros vivem com serenidade. No final das contas, só dá amor quem o tem dentro de si. Talhar pedras, plantar no concreto e outras coisas não valem a pena. E mesmo assim, continua-se acreditando. E quem está isento? Acredita-se ainda no amor. O chão corta os nossos pés, as palavras machucam os nossos ouvidos, mas amor é isso, não?
Não. Amor é um rio sereno, é um chão macio, é uma cama confortável. Amor é beijo na testa, é a preocupação em saber se o outro chegou bem. Amor é o olhar manso, terno e amoroso de quem nos ama e quer cuidar de nós. Amor é um bilhete carinhoso, é o cuidado com as palavras. Amor é sinceridade. Amor é alma e coração despidos.
Não sei se o amor acaba. Não quero falar sobre os deslizes ou sobre as coisas que dizem o amor suportar. Eu quero somente falar aos que amam. Quero falar sobre as delicadezas que só a coisa mais bonita que há no universo pode nos dar. Que venha o acolhimento.  Aqueles que não sabem amar e juntam as suas inseguranças a uma cultura violenta e imbecil, não aprenderam a buscar dentro de si o dom de acolher. Não aprenderam e não foram ensinados.
Que belo seria enxergar as mulheres com carinho. Ver força na fragilidade feminina e não usar virilidade masculina para oprimir, mas para proteger. Ainda utopia. Não queria falar das coisas tristes, mas, as coisas não andam sozinhas. Fiquemos então com o beijo na testa, isso basta.