Havia oito
pessoas na sala de cinema, fiz questão de contar no mínimo umas dez vezes para
ser fiel a minha história. Eu, dois senhores, uma senhora, um funcionário do
cinema e uma família: um idoso e dois jovens. Achei incrível uma sessão com
poucas pessoas, senti-me alguém fora da curva, sem ter o que fazer, talvez até
privilegiada em poder gastar duas horas da minha vida assistindo a um filme tão
ruim quanto a minha existência nesse momento.
Mais uma vez
observo um ser humano em crise, cansado, fugindo de suas atribuições e culpas.
O dedo em riste de tanta gente faz questionar sobre a qualidade das sementes
plantadas. Saber-se uma pessoa má é um choque para o ego. Confusa, não sei
direito onde mora a intuição e onde se esconde a loucura.
Ao meu lado,
uma velha companheira não contabilizada na sala de cinema repete os últimos acontecimentos
da semana e as palavras violentas batem em mim como fortes pancadas. O trailer
faz chorar, o filme não serve para rir. O filme, aliás, nunca caberia tão bem
nessa semana. Fosse ele bom, não haveria sentido em mais nada. Tinha mesmo que
ser fraco e incoerente para minha vida ganhar mais algum drama.
Encolho-me na
poltrona e em vez de esquecer os problemas, passo a remoê-los delicadamente num
ato masoquista e rebelde de quem não se ama e pretende continuar inflamando o
próprio coração. Perguntava-me como pessoas, apenas pessoas, em sua maioria com
dois braços, duas pernas, uma boca e estatura geralmente mediana, são capazes
de destruir tantas coisas.
Eu, com um
metro e sessenta, fui capaz de ser para outros muito daquilo que eu temia para
mim. Se há alguma solução para os problemas que eu mesma arranjei, ela está
perdida em algum lugar do meu próprio universo. Assim como a projeção do filme,
meus atos passam por meus olhos: ontem desci do ônibus numa parada qualquer,
sob o sol do meio dia, andei sem rumo, corri, atravessei avenidas e parei
exausta com as pernas bambas, a pele ardendo e a cabeça latejando; revi a
surpresa nos olhos dele e a lua nascendo vermelha; ouvi a voz de quem me teve
ao lado por dezesseis ciclos solares e hoje me detesta. Tudo acaba.
É como se
tivessem jogado fora um alimento mofado, mas que eu gostava de comer. É como se
tivessem exposto minhas mazelas e agora elas tivessem sorrindo e acenando na
enorme tela do cinema da minha cabeça esquisita. Acompanham essa sessão mental,
um mal estar crônico e alguma leveza ao ver o lado mais escuro da minha lua.
Daqui a pouco,
as projeções de hoje cessam, mas, já adianto que em algumas horas pretendo escrever
outros roteiros. Dessa vez mais felizes, assim espero.
