sexta-feira, 5 de junho de 2020

O que dizem os vapores


Caminham os vapores dançantes em animadas correntes elétricas. Deixam o hipotálamo gritar de amores, atiçando o sistema límbico. Dizem para ela: é ele que está aqui, inteiro. Em instantes a mulher desmancha dentro do tórax e as suas pupilas saltam, como se quisessem o segundo fracionado e guardado pela eternidade.                                               
Facilmente se reconhecem, como bons primatas que são. Os dois, um feliz encaixe entre moléculas de odores e proteínas. Como diferenciá-los dos anuros ou das abelhas? Agarram-se, porque não precisam mais pensar, misturam-se porque a vida é encaixe e impermanência.
Vivem de apegos. Visitam os bons cheiros esquecidos: o cheiro do joelho, a roupa bem lavada, o cabelo depois do banho, a alegria que emana do pescoço. Ignoram os próprios vapores, mas vivem pelos rastros do parceiro.  Farejam os lençóis depois da despedida, ressoando saudade no travesseiro.                                                                                                  
Posso imaginá-los em abstinência, estremecendo, caso sintam, ao andar na rua, qualquer partícula de oxigênio adulterada que lembre a causa da embriaguez. Um ser humano que mora no outro e deixa profundas insígnias na memória alheia. Cheiro-casa, cheiro-presença, átomos repartidos, vida a plenos pulmões.                                                         
            Pequenas estrelas multicolores que andam por rotas e veias, alimentam o vício pela geografia do corpo, ditam paixões e reverberam em pacífico amor. Que histórias contariam os perfumes em suas etéreas aventuras? Enquanto isso, eles se amam.